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O design dos não designers

TEXTO Solange Coutinho

01 de Novembro de 2012

Solange Coutinho

Solange Coutinho

Foto Passarinho/Divulgação

As informações efêmeras estão por toda parte, nos muros, mercados e feiras. Oferecem serviços gerais, vendem, consertam, entregam. Podem ser pintadas em superfícies móveis ou fixas, em papelão, compensado ou numa cadeira. Essas mensagens configuradas por meio do letreiramento (letras feitas à mão) fazem parte do nosso cotidiano, compõem a paisagem urbana do centro ou da periferia, executados por anônimos, em sua grande maioria.

Mas há também aquelas que estão nos acervos – são rótulos, panfletos, canhotos de passagem, convites. Impressos em tipografia, xilo ou litografia, são também efêmeras. Todavia, sobrevivem colecionadas por alguns outros anônimos ou salvaguardadas em centros de documentação, como no acervo da Fundaj, da UFPE, do Arquivo Público Estadual, Biblioteca Pública Estadual, Junta Comercial, Museu da Cidade do Recife, apenas para citar alguns.

Todo artefato de memória gráfica teve, e tem, o propósito de solucionar um problema de comunicação. Não nos interessa somente seu valor estético, mas como os originadores de tais informações elaboram os desafios de configuração gráfica e como dominam ou desenvolvem as tecnologias em cada período.

O design formal no Brasil é iniciado com as primeiras escolas entre os anos 1950 a 1970. Entretanto sabemos que as atividades nesse campo são anteriores a isso. Pois, como não havia uma formação profissional específica em design, quem executava tais tarefas editoriais e gráficas eram os artífices mais experientes no processo produtivo. Somados a eles, artistas plásticos cuidavam das ilustrações, logotipos, emblemas e marcas expressas antes da constituição do Design.

Não obstante, com o advento dessas escolas, cuja raiz é estruturalmente europeia (Bauhaus e Ulm), portanto descontextualizada do fazer brasileiro, identifica-se uma ruptura, uma inconexão. Muitos artífices ficaram à margem do mercado profissional, enquanto muitos designers foram formados “sem saber olhar” para as experiências locais. Hoje, porém, percebemos que há sinais de reconhecimento do passado, assim como um diálogo entre a produção informal e a formal. A apropriação e transposição dos elementos da cultura popular e/ou periférica para a cultura “dominante”, talvez se explique pela busca do fortalecimento de identidades, ou de uma localidade, em meio ao contexto da globalização.

Certos de que a história e, sem dúvida, os artefatos de memória gráfica podem incitar, despertar e ampliar os horizontes do próprio entendimento do design no Brasil, o reconhecimento dos projetistas do passado e aqueles do presente permite alargar os sentidos dos futuros designers, sem descriminação, aprendendo o design do não designer.

Nessa perspectiva, conduzimos investigações multicêntricas compondo uma variedade de temas. Alguns dissecam as tecnologias enquanto outros estudam ilustradores, fundidores e impressores ou mesmo periódicos específicos. Somente na UFPE, são mais de 20 pesquisas em Design. Essas são as raspas e restos que nos interessam. 

SOLANGE COUTINHO, professora da UFPE, doutora em Design.

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