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O protagonismo da Direção de Arte

TEXTO Séphora Silva

01 de Julho de 2012

Séphora Silva

Séphora Silva

Foto Divulgação

"Tudo o que você vê na tela é direção de arte." Essa frase da cineasta Lina Chamie me acompanha há anos. Ela, em minha opinião como diretora de arte, sintetiza perfeitamente o significado dessa função no cinema: a encantadora missão de materializar palavras e transformar os pensamentos do diretor em quadros compostos de magia, desejo e sentimentos dos mais diversos. A concepção imagética da direção de arte transpassa a construção de cenários arquitetônicos, urbanísticos, design e interiores, pesquisas histórico-sócio-político-econômicas, elaboração de figurinos e caracterização de personagens, que vai além dos símbolos que traduzem suas personalidades.

Deliberar o nascer e o renascer de pessoas, resgatar cidades, conferir a objetos banais e presentes no nosso cotidiano uma importância e uma percepção toda especial. Realçar um detalhe arquitetônico que não retrate apenas uma época, mas o torne fundamental para a dramatização da narrativa; ressaltar uma obra de arte e fazê-la – além de pictórica – conectar-se diretamente com a cena, dando-lhe um significado psicológico muito mais profundo e assimilável ao espectador, por torná-lo mais sensível e intenso. Bulir com as cores, não somente com suas tonalidades e nuances, na intenção de conferir sua função primeira de colorir o cenário e tornar a fotografia mais bela e instigante, mas despertar sensações subliminares que podem ir do mais profundo sonho ao mais aflitivo desconforto.

O diretor de arte é um pesquisador do mundo, de como ele funciona, como se mostra, de todas as culturas, de todas as formas de comunicação visual. A tarefa de tornar uma realidade criada para alguns minutos de projeção em uma eternidade para os olhos do espectador é fazê-lo crer que tudo o que ele vê é a mais pura verdade, ainda que fantasia explícita e proposital dentro da concepção fílmica de quem a dirige.

É tão fascinante saber que podemos proporcionar uma sucessão infinita de impressões através das nossas decisões estéticas e plásticas, e que, uma vez dentro do cinema, com a luz apagada e projeção em luz, tantas mentes irão se emocionar com o que veem na tela, e tudo isso causado por essa gama de elementos pensados na direção de arte para transcender o comum, ainda que mero e corriqueiro e, às vezes, quase inexistente na cena. Como profissional apaixonada pela sétima arte, acredito na capacidade de aprimorar a comunicação através da linguagem visual e promover uma transformação constante na vida dos espectadores, não somente no que diz respeito ao seu gosto estético, mas, principalmente, ao torná-los mais críticos e sensíveis às coisas do dia a dia. 

SÉPHORA SILVA, arquiteta, urbanista, cenógrafa e diretora de arte.

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