No campo da literatura, ausências notórias foram as de Monteiro Lobato e de Juó Bananére, responsável por esquetes cômicos em O Pirralho. Na arquitetura, faltou Victor Dubugras, que, em 1907, havia construído a estação ferroviária de Mairinque, utilizando o arrojado concreto armado num estilo vinculado aos “modernos” austríacos e alemães originários da Sezession. Também foram esquecidos chargistas como Voltolino, J. Carlos e Belmonte. Porém, mais do que um saldo negativo, tais ausências denotam o traço de improviso e liberdade do festival conhecido como Semana de 22. Um movimento espontâneo e iconoclasta que, desde o início, pulsou em meio a forças opostas, oscilando entre o nacional e o estrangeiro, o popular e o erudito, a vanguarda e o consagrado, a revolução e a ordem.
Noventa anos depois daquelas vaias, o modernismo inaugurado pela Semana de 22, que jamais superou sua ambiguidade, deixa como legado maior a instituição da antropofagia, uma das respostas mais lúcidas para a questão de como assimilar o estrangeiro sem cair na imitação nem se tornar vítima do modelo importado. Conjugando o léxico das vanguardas europeias com a pujança das nossas tradições populares, alcançou o desejável equilíbrio entre enraizamento nacional e pertencimento universal.
MÁRCIA CAMARGOS, doutora em História pela USP, é autora do livro Semana de 22: entre vaias e aplausos.