Um tratamento de restauração limita-se ao material com o qual a obra é construída, considerando-se que a sua significação enquanto arte é algo subjetivo, sendo impossível para o restaurador atuar sobre esse campo. De fato, o que se recupera são os elementos físico-químicos que compõem a obra, não o seu conceito, sendo os materiais que lhe dão forma utilizados como veículo e suporte para a materialidade de uma abstração. Logo, o que se restaura não é a obra de arte enquanto tal, mas a sua matéria.
A restauração, há muito tempo, deixou de ser uma atividade empírica, “artesanal”. Atualmente, essas ações estão amparadas em sólidas teorias fundamentadas em profundos processos do conhecimento científico e tecnológico. Vários ramos da ciência dão suporte à prática do restauro, oferecendo bases para um grande alcance no conhecimento da matéria da obra de arte, assim como acontece em todo o processo prático de um tratamento de reparação, através de equipamentos e materiais de alta tecnologia. O domínio desses conhecimentos se faz essencial para o trabalho de reconstituição, tornando-a bastante criteriosa e, suas possíveis intervenções, mais precisas.
Existem diferentes níveis de intervenção num tratamento de restauro sobre uma obra de arte, sempre direcionados a estabilizar e recuperar a resistência do material que constitui a obra, não implicando necessariamente em maiores interferências. Outros tratamentos, entretanto, podem exigir uma intervenção mais elevada, inclusive na imagem, porém, sempre partindo de sua unidade potencial, que é a referência de capacidade contida na obra ou em seus fragmentos, para oferecer informações para sua recuperação. O nível de interferência de um restauro será condicionado ao nível de degradação em que a obra se encontra, e o que a restauração faz é devolver à obra resistência e durabilidade do ponto de vista físico e uma melhor apresentação estética.
ROBERTO CARNEIRO DA SILVA
Técnico em preservação e restauro
A restauração deve se limitar ao restabelecimento da unidade potencial da obra de arte. Uma intervenção, por mais criteriosa que seja, compromete a originalidade das peças, visto que voltar a uma situação anterior conhecida é enganar-se ou enganar quem contempla a obra. Há níveis de comprometimento, conforme o tipo, a metodologia, os materiais aplicados, além do técnico que irá desenvolver o trabalho.
Mesmo com o aparato técnico e científico que se tem, atualmente, visando intervir o menos possível na obra de arte, o objeto fica vulnerável.
A restauração se move, nos dias atuais, pelo que pensamos e como conhecemos, e até mesmo pelo gosto estético de hoje.
Partindo do princípio de que é melhor e mais prudente conservar do que restaurar, este se aplica direta ou indiretamente sobre um objeto, em relação ao qual há o intuito de estancar ou minimizar seu processo de deterioração.
O restauro, como última instância, pode e deve devolver a integridade física, bem como a leitura formal, estética e simbólica de uma obra. Isso, possivelmente, irá valorizar e restituir o seu significado, mas a sua aparência original ficará comprometida, pois os materiais aplicados não são mais os mesmos.
Restaurar significa, especificamente, remediar danos. Quanto menos se estender, menor será a perda da originalidade da obra e isso se aplica a qualquer obra: arquitetônica, revestimento azulejar, papel, pinturas com diversas técnicas e em diversos suportes, entre outras.
Mesmo com os cuidados que deverão ser levados em conta, aplicando os princípios da restauração como: reversibilidade, compatibilidade, durabilidade e distinguibilidade, utilizando materiais e equipamentos próprios para esse tipo de interferência, a intervenção realizada certamente compromete a originalidade da obra. Sua autenticidade se vai com a adoção das novas técnicas e dos novos materiais aplicados. As ruínas apenas entristecem. Uma restauração inepta revolta, amargura, ofende”.