Entre eles, está Frases lapidares, trabalho de estreia, em 1984, uma coletânea de aforismos concebidos durante sessões de tédio, sofridas no período em que o futuro jornalista se extraviou numa graduação em Ciências Contábeis. Um raro exemplo de sua produção não paradidática, assim como Amores nublados e um Noturno de Chopin, de 1998, inspirado numa brasileira que morava em Londres, fã da coluna dominical de crônicas Curto e Grosso, que ainda escreve no Jornal do Commercio. “A mãe dela enviava os textos por fax”, lembra.
A coluna no JC rendeu uma trilogia homônima, contendo compilações. Há, ainda, livros dedicados ao futebol (Montinho artilheiro) e vários relativos à área de sua atividade jornalística, como crítico musical. José Teles escreveu sobre a vida de personalidades pernambucanas (Luiz Gonzaga, Capiba e Chico Science, por exemplo) e de movimentos artísticos, como o frevo e o manguebeat, além do baião e de um resgate do anárquico e politizado bloco carnavalesco Siri na Lata. Sobrou até para o pop inglês: Odeio os Beatles é um romance com cara de ensaio sobre a solidão humana, pautado no tal lonely hearts club do álbum Sgt. Pepper’s.
O pequenino volume de aforismos foi o livro de estreia do autor, em
1984. Foto: Reprodução
Assim como todo escritor, José Teles também sonhou em escrever o “romance da sua geração”. E até o fez, datilografando, numa máquina de escrever, 600 páginas de uma história de amor nos tempos da ditadura militar, que começava no ano do golpe, em 1964, e findava em 1979, no comício de retorno do exílio do ex-governador deposto pelos militares, Miguel Arraes. A odisseia sentimental não resistiu, porém, a um infortúnio matrimonial do autor – e o livro, como acontece com as demais outras partes envolvidas num divórcio, ocorrido em 2000, acabou desaparecendo.
O enredo, porém, foi reciclado e adaptado ao universo adolescente, no paradidático Rumo ao infinito, no melhor estilo “nada se perde, tudo se transforma”. Filosofia que também transportou o amor shakespeariano entre Romeu e Julieta para o sertão pernambucano, em Amando o inimigo. “Um dos livros que me causaram algum problema”, conta José Teles, a respeito de escolas religiosas se decidirem em não adotar o título pelo fato de, assim como acontece no original, um padre “alcovitar” o romance entre membros de famílias inimigas. “Em Os sons dos bichos, houve quem achasse politicamente incorreta a referência aos peixes serem surdos-mudos, pois não faziam barulho.”
Buscar inspiração nos clássicos, e também no universo pop, é um dos segredos de José Teles, para não sofrer do “branco criativo”. Bem-vindo ao meu pesadelo, por exemplo, remete ao título de um álbum de Alice Cooper. “Para falar de bullying, me inspirei em outros trabalhos que tocam o assunto, como o filme baseado no livro de Stephen King, Carrie, a estranha, e também em Juventude transviada, com James Dean”, explica. A pesquisa, igualmente, é parte do processo, técnica destilada no ofício de jornalista, como a apuração para escrever sobre o drama do consumo de crack entre os jovens, exposto em O perigoso caminho das pedras.
A história vai se formando na cabeça do jornalista durante o dia, principalmente no trajeto de ida e volta para a redação do jornal. “Pego o ônibus e vou encaixando as peças do quebra-cabeça”, explica o escritor, para finalizar o processo de produção com um detalhe que ilustra muito bem sua habilidade: “A partir daí, escrevo em, no máximo, 15 dias”.
Um dom que garante um rendimento satisfatório ao escritor, mas que poderia ser muito maior, segundo ele. “Se fizesse o mesmo no Sudeste, além de vender mais, correria o risco de ter uma das minhas obras adaptadas para a TV ou para o cinema”, especula Teles, que, mesmo antes de a série literária Crepúsculo conquistar os leitores do mundo todo, escreveu uma história sobre adolescentes e chupadores de sangue em Edgar, o vampiro de Boa Viagem.
Se Teles não consegue se lembrar, precisamente, do seu passado literário – estima em 40 o número de livros que escreveu –, o futuro, então, preocupa-o menos ainda. “Talvez vire apenas um autor póstumo de obras póstumas”, reflete, mais complicando do que explicando. Natural para quem, no trabalho de estreia, dedicou uma das frases lapidares à posteridade: “O que me dá medo da morte é que, depois, pode haver uma outra vida. E pior, eterna”.
ÁLVARO FILHO, jornalista, escritor e professor universitário.