Edição #103

Julho 09

Nesta edição

Prato do dia - Jornalismo sem diploma

Foi revogado, no mês passado, decreto que desde 1969 dispunha sobre a obrigatoriedade de diploma para exercer a função de jornalista no Brasil. O Supremo Tribunal Federal (STF) ponderou, principalmente, o aspecto político da decisão, já que a legislação datava do regime militar, quando o governo pretendia vigiar e censurar qualquer produção noticiosa que confrontasse o poder vigente.

Ainda que esta seja uma justificativa histórica relevante, por que tanto tempo desde a abertura política para promover tal revogação? Que interesses e contextos subjazem à decisão? Ainda nos anos 1980, quando se discutia a liberdade de imprensa, entre outras prerrogativas da descompressão política, o jornalista Clóvis Rossi falava em “liberdade de empresa”, expressão irônica que já apontava ali quem definia as regras do jogo. E, claro, não eram os jornalistas empregados e prestadores de serviço de uma atividade que – embora já exercida oficialmente no país desde a primeira metade do século 18 – apenas começava a esboçar um campo profissional, que se estabelece quando são definidas as bases de sua constituição e estas são reconhecidas como legítimas pela sociedade.

Quais os atributos da profissão de jornalista? Porque, se o STF entende que é desnecessário cursar a graduação para ser jornalista, este campo não se estabelece pelo aprendizado sistemático em sala de aula, mas pela prática profissional, para a qual qualquer indivíduo pode se candidatar, sendo assim as redações de jornais, TVs, rádios, revistas e quaisquer outros meios de informação, um campo aberto, uma feira livre.

Curioso como esta ideia se soma à atual realidade da produção e difusão de informações via web, celulares e variadas fontes digitais ou virtuais. Desde que a internet surgiu, a produção noticiosa pelos tradicionais meios massivos e poderosos conglomerados de mídia vem sendo sistematicamente questionada. E os motivos vão desde a velocidade de transmissão de informação à polifonia e diversidade de pontos de vista, ambos infinitamente maiores no campo virtual. Assim é que esta decisão chega ao Brasil num momento em que a produção industrial de informação, pautada pela objetividade (um dos pilares do jornalismo moderno), vem sendo desacreditada no mundo todo.

A Revista Continente entende a complexidade do tema – que será seguramente objeto de estudos acadêmicos demorados e aprofundados. O que buscamos, nesta edição, é repercutir o assunto ainda no calor da hora, indo além do factual, apontando sinais de que a questão transcende a polêmica meramente corporativa. Tomara que não tenhamos que esperar outras quatro décadas para conseguirmos entender esta mudança com a clareza que ela demanda.

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