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Nudez: Muito além de embalar a música

Capa de 'Selvática' está em consonância com movimentos em defesa da libertação do corpo feminino e da apropriação das imagens individuais

TEXTO Débora Nascimento

01 de Novembro de 2015

Karina Buhr em campanha feminista no Dia da Mulher

Karina Buhr em campanha feminista no Dia da Mulher

Foto Divulgação

[conteúdo vinculado à reportagem de "Sonoras" | ed. 179 | nov 2015]

Karina Buhr já havia sido censurada no Facebook
, quando participou de uma campanha, em 2012, ao lado de outros artistas, em que aparecia de topless, num protesto contra a postura equivocada da maioria dos homens em relação ao Dia Internacional da Mulher. Agora, com a capa de Selvática, uma nova censura já seria esperada. Afinal, a rede social tem, dentre suas regras, o veto claro à publicação de nudez.

A artista, por sua vez, defende o direito das mulheres de exporem seus corpos como manifestação da liberdade da qual deveriam dispor, e não apenas serem objeto da manipulação das regras impostas pelo sexo masculino.

O discurso de Karina entra em consonância com movimentos que vêm despontando no mundo todo, como o Free the Nipple, cuja hashtag circulou com frequência pelas redes sociais em 2014 e que rendeu filme homônimo, dirigido pela ativista Lina Esco, lançado em dezembro do ano passado.

“As mulheres, na América, recebem 78 centavos por dólar que recebe um homem no mesmo posto de trabalho. No fundo, é uma questão bastante simples, apoiada em uma mercantilização do corpo. Há muito dinheiro que trata de esconder o mamilo: se permitissem o topless, chegaria um ponto em que as pessoas se cansariam de vê-lo, deixaria de ser um tabu e aí perderia todo esse valor sexual de coisificação feminina que há na indústria. Por isso, o mamilo é um símbolo que a América necessita. Ver um montão de tetas por todo lado para que superem esta merda de uma vez. Não é só fazer topless para conseguir igualdade em relação aos corpos, há muito mais por trás”, defendeu a diretora, à época.

A campanha Free the Nipple começou a partir da reclamação da garantia básica do direito das mulheres amamentarem seus filhos em público, sem sofrerem retaliações ou preconceitos, e acabou sendo ampliada. A iniciativa angariou o apoio de artistas como a atriz, roteirista e diretora Lena Dunham (Girls) e as cantoras Miley Cyrus e Soko – que se despiu para a ação.

Além do uso da nudez feminina em manifestações nas ruas e no cenário das artes plásticas, a exemplo do trabalho da artista visual sérvia Marina Abramovic e de Yoko Ono – que, ao lado de John Lennon, apareceu nua (em frente e verso) na famosa capa de Two virgins (1968), lançado em novembro, um mês depois de 19 mulheres despidas estamparem Eletric ladyland, de Jimi Hendrix –, ela, a nudez, volta agora a público através de discos de cantoras pop. Embora não fique claro quando o intuito tem a ver com protesto, ação de marketing ou apenas exibicionismo.


Lennon e Yoko, Gal Costa, Miley Cyrus e Madonna já lançaram mão da nudez.
Fotos: Divulgação

Rihanna, vez ou outra, aparece de topless, como no seu último álbum, Unapologetic (2012). Outras estrelas, em fotos menos evidentes, também surgiram sem blusa, mas sem exatamente mostrar os seios, como Beyoncé, na sua estreia Dangerously in love, em 2003, e Janet Jackson, em Damita Jo, de 2004, mesmo ano do polêmico episódio do mamilo à mostra na performance com Justin Timberlake no Super Bowl, o tal nipplegate ou wardrobe malfunction. Para este ano, já foi anunciada uma nudez insinuante (sem mostrar nada) na capa do próximo disco de Selena Gomez.

A supracitada Miley Cyrus, que se mostrou sem roupa em Wrecking ball (2013), clipe com mais de 800 milhões de visualizações no YouTube, anunciou que vai realizar show com a The Flaming Lips, em que ela, os músicos e a plateia, todos, estarão nus.

Há 15 anos, Björk lançou o clipe Pagan poetry, que também rendeu bastante polêmica com a exibição de seus seios. Quatro anos antes, Alanis Morissette se despiu no videoclipe de Thank you, mas com efeitos especiais para cobrir as partes íntimas.

Enquanto algumas cantoras usam artifícios para disfarçar a nudez, Madonna a explorou destemidamente, e por dois motivos: dinheiro e polêmica. O primeiro, no começo da carreira, o segundo, sempre. Em 1992, quando já havia lançado hits suficientes para toda uma vida na música pop, publicou o livroSex, com fotos de Steve Meisel. Na mais famosa delas, está nua pedindo carona. Em dezembro do ano passado, realizou um ensaio sensual para a Interview, em que mostrava os seios, esbanjando a ótima forma aos 57 anos.

Em suma, botar o peito para fora não é exatamente uma novidade entre as cantoras. Mas o Brasil, mesmo com a Marquês de Sapucaí, tem poucos exemplos nessa área. Até a chegada de Selvática, as mais marcantes tinham sido Gal Costa, que mostrou os seios em Índia (1973), tirou a roupa para a revista Status, em 1985, e abriu a blusa ao interpretar Brasil (Cazuza), em 1994, influenciada pelo diretor Gerald Thomas, e Cássia Eller, que subia a camiseta ao cantar Smells like teen spirit, de Kurt Cobain, em 2001 – gesto marcante que rendeu uma homenagem à intérprete no último Rock in Rio, em que diversas artistas, como Zélia Duncan e Mart’nalia, levantaram suas blusas.

O controverso episódio Karina Buhr x Facebook dividiu a opinião pública, mas a artista conquistou uma adesão na própria rede social, de fãs, amigos e de sua mãe, que postou foto com um seio à mostra. No mesmo período, foi lançado o ensaio Selváticas, de Beto Figueirôa, que contou com a participação de 13 mulheres, além da cantora, que se despiram e deram a sua colaboração para um possível novo rumo da história. 

DÉBORA NASCIMENTO, repórter especial da revista Continente.

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