Em outro site, encontramos um artigo sobre os seus 70 anos, comemorados no ano passado. O autor diz que a cantora não abandonou a música “totalmente”, ainda que não dê qualquer informação de novo álbum ou noticie shows recentes. Há apenas a informação de que, nos últimos anos, ela estaria se dedicando à pintura e a reprise da história de sua dedicação aos animais. E só. De resto, o velho papo sobre sua mudança para os EUA nos anos 1960 e a divulgação da bossa nova pelo mundo.
Nas imagens do Google, quase não há foto de Astrud envelhecida. A maioria se refere à cantora nos anos 1960 e 1970, muitas vezes com um penteado bolo de noiva, que parece adequado a artistas que se cristalizaram como ídolos da lounge music – a tal “música de elevador”. A musa cool da bossa nova não pode mesmo envelhecer.
Seu último álbum, Jungle, foi lançado há 10 anos e é um trabalho estranho, para dizermos o mínimo. A começar pela capa, com cores e tipografia de péssimo gosto, que mostra Astrud como uma ultramaquiada hippie, que parece não saber direito em que ano está. Mas por que usar a imagem de uma selva (jungle), se pensamos nela como uma eterna visão à beira-mar? O álbum tenta “modernizar” seu som, com um resultado equivocado. A maioria das canções é inédita, quando o melhor do seu repertório consistia num delicado rosário de regravações de standards.
Há algo de interdito em Jungle e que não conseguimos localizar ao certo, como se essa Astrud não fosse mais “aquela” Astrud. Talvez inalcançável para si mesma, ela tenha resolvido se tornar dessa forma para o resto do mundo. Explicação plausível, ainda que não inteiramente satisfatória.
Após a pesquisa “internética”, chegamos à conclusão de que Astrud, assim como João, não existe. Ambos são personagens de um outro tempo, de um reflexo que o Brasil teve de si mesmo, e pronto. A face ficou perdida naquele espelho para sempre.
Astrud e João são “fantasmas” (ou mesmo “vampiros”, como Fischer chega a chamar o seu ídolo no livro), com raras permissões para fazer contato com o “mundo dos vivos”. Tão fantasmagóricos quanto a frustração amorosa que fez o jornalista alemão acreditar que a cura para um coração em frangalhos estaria em algum lugar da letra de Ho-ba-la-lá.
SCHNEIDER CARPEGGIANI, jornalista, editor do suplemento Pernambuco e doutorando em Literatura.