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Não se apresse em não gostar do novo do Radiohead

Quinteto inglês lança oitavo disco de estúdio, o polêmico 'The king of limbs', que avança nas experimentações sonoras e até apresenta faixas que nos remetem ao forró

TEXTO Débora Nascimento

01 de Abril de 2011

Quinteto é formado por Phil Selway, Thom Yorke, Ed o’Brien, Jonny e Colin Greenwood

Quinteto é formado por Phil Selway, Thom Yorke, Ed o’Brien, Jonny e Colin Greenwood

Foto Divulgação

Na época de seus primeiros discos, Pablo honey (1993) e The bends (1995), o Radiohead era apenas mais um ótimo grupo de rock inglês, com hits tocando em rádio. Depois de seu terceiro álbum, Ok computer (1997), o “caldo engrossou”: a banda virou “a” banda, e seu líder, Thom Yorke, foi alçado ao status de gênio. Parecia difícil ouvirmos algo que superasse o que já seria seu ápice. Daí, surge Kid A(2000), um disco tão estranho, complexo e diferente, que parecia ter vindo de outro planeta. O Radiohead começa, então, a fazer músicas complicadas – dificílimas para o fã tocar no violão ou de serem reproduzidas por bandas covers. Seguiram-se Amnesiac (2001), uma continuação menos impactante de Kid A, e o mediano Hail to the thief (2003). Daí, quando não se esperava mais uma surpresa, chega, em 2007, In rainbows, o discaço que abriga uma das composições mais surpreendentes da banda, 15 step, um jazz rock psicodélico que faria Miles Davis, se estivesse vivo, querer saber “quem são esses ingleses?”.

Esse prólogo serve para nos ajudar a entender a recepção que obteve The king of limbs, o novo CD do grupo. A crítica apressou-se em publicar as resenhas – um perigo, em se tratando do Radiohead, pois suas músicas costumam ficar melhores com o tempo. O disco pode não superar o In rainbows, mas tem muitas qualidades. A primeira delas é o nítido empenho do quinteto inglês em não repetir clichês e fórmulas, e querer fazer sempre algo incomum, mesmo que, para isso, corra riscos. Saber fazer hits, esses britânicos sabem. Estão aí Creep, Fake plastic trees Karma police, que não deixam mentir. Mas é preciso ir além. E é isso o que o grupo vem ensinando a seus colegas, ao elevar o nível do rock atual.

O Radiohead, quando se libertou, por conta própria, do contrato com a Capitol, em 2004, estava dando um belo exemplo de dignidade e independência artística. Depois, mandou um outro recado à indústria quando disse, em 2007, “paguem o quanto quiserem pelo download”, que já seria gratuito, do In rainbows. A resposta dos fãs foi tornar esse o álbum mais rentável da banda.

Com o The king of limbs, o conjunto, mais uma vez, procura não parecer com nada do que está por aí. No máximo, pode-se dizer que “o estilo é radioheadiano”. No entanto, dessa vez, a banda não conseguiu se superar, as músicas não trazem muita surpresa, apesar de ainda manter a escala de qualidade bem acima da média.

O álbum abre com o piano de Bloom, que engata num emaranhado de polirritmia, na qual a bateria parece que foi gravada invertida, lembrando até o ritmo do cavalo-marinho nordestino. Há milhões de barulhinhos, camadas de vozes que se misturam, sintetizadores, metais etéreos ao longe, baixo jazzístico. Tudo contornado pela incrível voz de Yorke e o importantíssimo baixo de Colin Greenwood.

Em seguida, surge o que podemos chamar de “os dois forrós do Radiohead”, Morning Mr. Magpie e Little by little. Na primeira, há uma viola dialogando com o baixo e uma marcação rítmica gutural que entremeia os instrumentos. Já a segunda começa com um entrelaçamento de violão, baixo, bateria e vários sons de percussão. Como se fosse um mashup, a faixa vai sendo pontuada pelo som que parece ser de triângulo, zabumba e sanfona, num volume mais baixo (e aqui vai uma dica: esse disco deve ser ouvido num aparelho de som decente ou com um eficiente fone de ouvido – caso contrário, a audição vai perder diversas nuances).

Outro destaque é a faixa seguinte, Feraldubstep, que parece uma colagem de vários ecos na voz e nos instrumentos. E, então, chegamos ao hit Lotus flower, mais conhecido como a música do clipe em que Thom Yorke faz “uma dança bem diferente”, como diria Raul Seixas. No YouTube, o vídeo conta com quase 8 milhões de acessos e já ganhou dezenas de paródias e remixes, até com Minha mulher não deixa, nãoLotus flower surgiu, pela primeira vez, em outubro de 2009, em versão acústica no show do projeto solo do cantor, The eraser, e já exibira sua força apenas com voz e violão.

A partir dessa música, o curtíssimo The king of limbs apresenta menos danações rítmicas e fica mais melodioso. Codex se apoia no piano e na interpretação emocionante e precisa do vocalista, tendo ao fundo sintetizadores e um trompete cheio de reverbs. Os barulhinhos de passarinhos ao fundo anunciam Give up the ghost, com violão folk, e uma batida no instrumento marcando o ritmo. E aí, o disco encerra-se após a belíssima Separator, cuja melodia protagonizada pela guitarra intrincada de Jonny Greenwood ou Ed O’Brien (o encarte não traz ficha técnica das faixas) deixa um gosto de quero mais. 

DÉBORA NASCIMENTO, repórter especial da revista Continente.

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